Facisc dados invocados sobre os gargalos da habitação e alerta para a urgência de estratégias para acolher a nova força de trabalho no estado
Santa Catarina vive hoje um dos maiores desafios habitacionais do país. Dados levantados pela Federação das Associações Empresariais de Santa Catarina (Facisc), e divulgados na última sexta-feira, 5/9, durante o “Quais as estratégias para vencer o gargalo da habitação quando pensamos em importar mão de obra?”, revelam que o estado teve o segundo maior crescimento do déficit habitacional do Brasil entre os estados com maior economia, especialmente no período pós-pandemia.
Segundo a FACISC, Santa Catarina tem um déficit habitacional de 190 mil moradias. Os dados são calculados pela Fundação João Pinheiro, a partir da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e analisados pela FACISC. Os dados são de 2022, os cálculos mais recentes pela fundação e disponibilizados pela Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC).
Com um aumento expressivo de famílias que comprometem mais de 30% da renda com aluguel — sobretudo entre aqueles que ganham até três anos mínimos — e um salto de 114% no número de domicílios improvisados entre 2016 e 2022, o cenário exige soluções urgentes.
“Esse crescimento está diretamente relacionado ao aumento populacional impulsionado pela migração interessante e internacional”, explica Milvo Zancanaro, diretor da Voz Única da FACISC. Santa Catarina registrou um crescimento populacional de 32% entre 2009 e 2024, o segundo maior do país. Um dos destaques é a chegada de 27.212 imigrantes venezuelanos, número que posiciona o estado como o principal destino da estratégia de interiorização da população vinda da Venezuela, mesmo sendo o segundo mais distante geograficamente.
“Essas famílias desempenham um papel importante no preenchimento da deficiência de mão de obra, essencial para o desenvolvimento econômico do estado. Mas não basta trazer força de trabalho — é preciso oferecer condições dignas de moradia”, alerta Roberto Carlos Cardoso, membro do Conselho Fiscal da FACISC.
Marco Antonio Corsini, diretor de Articulação Estratégica da FACISC, destaca que é necessário alinhar políticas públicas, planejamento urbano e articulação institucional para atender a essa nova realidade. “O grande desafio é equilibrar estratégias concretas com a atração de mão de obra, moradia ível e estruturada, e ao mesmo tempo fortalecer o desenvolvimento sustentável de Santa Catarina”.
Minha Casa, Minha Vida
O Programa Minha Casa Minha Vida (MCMV), principal política habitacional brasileira, ainda não acompanhou o ritmo de crescimento do estado. Santa Catarina está entre os últimos colocados na distribuição de moradias subsidiadas pelo Governo Federal, com apenas 37,6 mil unidades entregues desde 2009, e ocupa a 24ª posição proporcionalmente à população. Mesmo sem financiamento via FG TS, em que o estado teve mais de 318 mil moradias contratadas, Santa Catarina perdeu espaço nacional ao longo da última década — caindo de 6,2% em 2013 para 3,8% em 2024 da participação no programa.
Experiência de Maringá
Além dos números a Facisc também trouxe para o exemplos bem sucedidos que podem ser implementados em Santa Catarina, como é o caso de Maringá no Paraná. A cidade desenvolve ações na área de habitação por meio do Plano Habitacional de Interesse Social, com foco em oferecer moradias para famílias de baixa renda. A cidade realiza ações por meio da Secretaria de Habitação e Regularização Fundiária, que aplica políticas como a regularização fundiária de áreas informais, com a entrega de títulos de propriedade para moradores de bairros consolidados. Maringá também participa de programas federais, como o Minha Casa, Minha Vida, e promove a criação de loteamentos com infraestrutura básica, como o Jardim Itália e o Residencial João de Barro. Outra medida é o incentivo à autoconstrução orientada, com e técnico para famílias que constroem suas casas. Estas iniciativas são realizadas dentro de um planejamento urbano que integra moradia, mobilidade, serviços públicos e áreas verdes.
Matheus Barros, secretário de Urbanismo e Habitação de Maringá, o principal papel do poder público em relação à habitação é incentivo o que precisa ser incentivado. “Se pelo zoneamento, ele impede muitas vezes a construção de habitação a um preço ível, porque esses espaços não são verticalizados, através de programas como a criação de zonas especiais de interesse habitacional social, é possível ampliar essa possibilidade de construção de moradias em áreas específicas para habitação. Isso também é diferente de você permitir um zoneamento densificado antes de receber propostas, porque aí o preço e o valor da densificação é capturado pelo dono do terreno e acaba tornando a habitação mais cara de qualquer jeito.”
Felipe Carvalho Araújo, superintendente do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Maringá (IPPLAM), explicou que embora o país tenha produzido cerca de 7,7 milhões de moradias entre 2009 e 2022, o número de famílias sem o à habitação de qualidade aumentou de 5,9 para 6,2 milhões no mesmo período. “Produzimos muito, mas produzimos mal”, afirmou, destacando que muitas moradias foram construídas em áreas periféricas, sem infraestrutura ou o adequado a serviços básicos. Para Araújo, é urgente redefinir o conceito de habitação, que vai além do teto e envolve o à saúde, transporte, lazer e dignidade. Ele defendeu ainda a implementação de políticas como o aluguel social e destacou o potencial de mobilização de entidades empresariais para soluções científicas efetivas, especialmente em estados como Santa Catarina, que enfrentam desafios, mas também contam com capital humano qualificado para enfrentá-los.
A economista e doutora em Economia Juliana Franco, diretora do Conselho de Desenvolvimento Econômico de Maringá (Codem), destacou durante o FACISC Day a importância da participação ativa da sociedade civil organizada na construção de políticas públicas efetivas, especialmente no planejamento urbano e habitacional. “É extremamente importante que as lideranças das cidades entendam que elas têm um papel muito importante no desenvolvimento, principalmente na área de planejamento de médio e longo prazo do município, junto com o poder público”, afirmou. Segundo ela, a experiência bem sucedida de Maringá deve ter uma governança compartilhada estruturada, que garanta a continuidade de projetos mesmo diante da alternância de gestões. “Um prefeito fica quatro anos no governo, no máximo oito, mas a maioria dos projetos de infraestrutura e habitação são de longo prazo. Por isso, é essencial uma governança com a sociedade civil muito atuante para que isso não se perca ao longo do tempo.” Juliana também ressaltou que a qualidade de vida é um fator essencial para atrair talentos e investimentos: “Uma cidade pujante, com empregos, segurança, meio ambiente preservado e urbanismo sustentável atrai pessoas e gera prosperidade”. Por fim, ela chamou atenção para a reforma tributária e seus impactos: “Com o ISS sendo tributado onde é consumido, e não onde é produzido, é fundamental pensar o urbanismo estrategicamente para aumentar o poder de consumo dos cidadãos e garantir a saúde financeira do município.”